O processo para a criação da Comissão Binacional de Contas da hidrelétrica de Itaipu, acordado por Brasil e Paraguai em 2021, está parado desde 2023. O governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) travou a análise da proposta de instalação do órgão externo que deverá fiscalizar os gastos da empresa. De acordo com o Ministério das Relações Exteriores, o caso só deverá ser retomado a partir de junho, depois que os 2 países concluírem as negociações do chamado Anexo C, que redefinirá as bases financeiras das tarifas de energia.
Os gastos bilionários do lado brasileiro com projetos que não têm relação direta com a geração de energia têm sido alvo de críticas cada vez mais contundentes de políticos e da mídia. Entre outros gastos, Itaipu destinou R$ 1,3 bilhão para obras da COP30, conferência sobre o clima da ONU (Organização das Nações Unidas), que será realizada em novembro em Belém (PA), a mais de 2.800 km de Itaipu (que fica em Foz do Iguaçu, no Paraná). Outros R$ 15 milhões foram gastos em um evento cultural paralelo à Cúpula do G20, realizado no Rio, em novembro do ano passado.
As críticas abarcam também a falta de transparência na alocação desses recursos. Por ser uma empresa binacional, a hidrelétrica não está sujeita à fiscalização direta dos órgãos de controle brasileiros ou paraguaios. A usina diz, porém, que “já atende a padrões internacionais e tem uma política interna bastante rigorosa no controle das contas”.
O orçamento de Itaipu para 2025 destina quase R$ 9 bilhões (US$ 1,58 bilhão no câmbio atual) para a rubrica “outros”, em que não há especificação dos gastos. Desse total, R$ 4,8 bilhões (849,6 milhões) foram alocados para o lado brasileiro, e R$ 4,2 bilhões (US$ 730,5 milhões) para a gestão paraguaia. O montante é parte dos R$ 15,8 bilhões (US$ 2,8 bilhões no câmbio atual) que compõem o custo dos serviços de eletricidade para os consumidores brasileiros e paraguaios neste ano.
Esse tipo de despesa financia projetos e obras sociais, de infraestrutura, apoio cultural e preservação ambiental, entre outros. Além disso, desde 2023, o número de municípios beneficiados pela hidrelétrica passou de 54 para 434. Isso significa que a empresa pode destinar recursos para todas as cidades do Paraná e outras 35 no Mato Grosso do Sul.
Esses custos, no entanto, contribuem para encarecer a conta de luz dos brasileiros, principalmente dos moradores das regiões Sul, Sudeste e Centro-Oeste. Lula, porém, endossa e incentiva que Itaipu faça “política social”.
COMISSÃO BINACIONAL DE CONTAS
Em 5 de novembro de 2021, o então chanceler brasileiro Carlos Alberto França fechou um acordo com o também então chanceler paraguaio Euclides Acevedo para a implementação da comissão. As conversas entre os 2 países sobre o tema haviam começado em outubro de 2015, quando o Brasil propôs ao Paraguai a criação do órgão. Em 2016, os paraguaios responderam. A 1ª reunião do grupo de trabalho que negociou o texto foi realizada em dezembro de 2017, mas as conversas arrefeceram e foram retomadas em 2019.
Em setembro de 2020, o STF (Supremo Tribunal Federal) decidiu que o TCU (Tribunal de Contas da União) não poderia processar, julgar ou executar qualquer medida de fiscalização sobre Itaipu porque a hidrelétrica tem natureza supranacional e tal medida só poderia ocorrer após os 2 países decidirem em conjunto pela criação de uma instância para tal.
O acordo para a criação da comissão de contas foi celebrado em Brasília em 2021 por meio da assinatura de uma nota reversal, uma espécie de protocolo de intenções entre Brasil e Paraguai. O objetivo do órgão será garantir a transparência e a conformidade das contas e dos processos financeiros da gestão conjunta. O texto determina que a comissão seja formada por 3 integrantes do TCU (Tribunal de Contas da União) e por 3 integrantes da Controladoria Geral da República do Paraguai.
O acordo precisa ser analisado pelo Executivo e chancelado pelo Legislativo dos 2 países para só então entrar em vigor. O Paraguai já enviou o processo para o Congresso. Em 2022, o Itamaraty elaborou uma EMI (exposição de motivos interministerial) em que realizou consultas internas às áreas técnicas envolvidas, à consultoria jurídica e ao Ministério de Minas e Energia. Em agosto daquele mesmo ano, o Ministério das Relações Exteriores encaminhou o documento para a Presidência da República, por meio da Casa Civil.
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