Cristina Fernández de Kirchner, 72 anos, está inabilitada politicamente pelo resto da vida e terá que cumprir seis anos de prisão por administração fraudulenta. La Reina Cristina (“a rainha Cristina”), apelido dado por simpatizantes e pela imprensa, teve a condenação confirmada pela Suprema Corte. A máxima instância do Judiciário rejeitou, por unanimidade, o último recurso apresentado pela defesa. Em 2022, a ex-presidente de centro-esquerda (2007-2015) e adversária política do governo ultraliberal de Javier Milei foi condenada por corrupção.
Cristina teria participado do pagamento de preços superfaturados e em concessões duvidosas de contratos para obras públicas na província de Santa Cruz (sul) durante os oitos anos em que esteve à frente da Casa Rosada. “Justiça. Fim”, reagiu Milei na rede social X. Um editorial do jornal La Nación destacou “uma sentença que tutela a república e a democracia”. A ex-presidente tem um prazo de cinco dias úteis para se apresentar ante o tribunal e começar a cumprir a pena. Os promotores pedem a prisão imediata. A Justiça ainda decidirá se a pena será cumprida em um centro de detenção ou em regime domiciliar com tornozeleira eletrônica.
Pouco depois da divulgação da decisão judicial, Cristina manteve a postura desafiadora da véspera e discursou no quartel-general do Partido Justicialista, em Buenos Aires. “A verdade é que essa Argentina em que estamos vivendo não deixa de nos surpreender. À armadilha ao salário imposta pelo governo de Javier Milei, agora o ‘Partido Judicial’ agrega a armadilha ao voto popular”, declarou, ao fazer alusão aos cortes da aposentadoria e da pensão vitalícia — cujos valores chegavam ao equivalente a US$ 4,4 milhões (cerca de R$ 24,5 milhões). Ela acusou motivação eleitoreira na confirmação da sentença. “Esse caso tem um cronograma eleitoral maravilhoso”, ironizou. “Eles emitem a decisão um mês antes da oficialização das candidaturas na província (de Buenos Aires).” Cristina chamou três juízes da Suprema Corte — Horacio Rosatti, Carlos Rosenkratz e Ricardo Lorenzetti — de “triunvirato de pessoas inapresentáveis”.
Na noite de segunda-feira (9/6), Cristina tinha feito um pronunciamento, no mesmo lugar e enviou um recado para Milei. “Pode ir, prenda-me. O que vai fazer? As pessoas ganharão mais dinheiro? Você aumentará os salários dos argentinos? Financiará escolas e hospitais? Pagará a dívida com o FMI e os credores?”, questionou a peronista. “O povo sempre retorna. Talvez sob nomes ou formas diferentes, mas sempre há um caminho para a organização popular, e essa é a nossa obrigação como ativistas, aconteça o que acontecer”, acrescentou.
Professora de direito constitucional da Universidad de Buenos Aires (UBA), doutora em direito e membro da Associação de Magistradas e Especialistas Eleitorais da América Latina, Alejandra Lazzaro explicou ao Correio que a Suprema Corte aplicou o artigo 80 do Código Processual e não admitiu o recurso apresentado ao tribunal por entender que a decisão de 2022 estava em conformidade com a Carta Magna. “A Suprema Corte afirmou não estar habilitada a tratar do tema, porque não existe um agravo e os argumentos da defesa são insubstanciais. Cristina poderia apelar à Corte Interamericana de Direitos Humanos, mas não acredito nisso, porque a decisão foi muito fundamentada”, disse.
Para Lazzaro, Cristina perde um prestígio político importante. “Ela também pagará com sua liberdade, em uma prisão domiciliar, por conta de sua idade, e com seus direitos políticos. Cristina ficará inabilitada pelo resto da vida a cargos políticos”, disse a especialista. Pela lei argentina, réus com idade igual ou superior a 72 anos podem cumprir a pena em casa.
Mara Pegoraro, cientista política da UBA, afirmou à reportagem que a decisão da Suprema Corte de condenar e inabilitar Cristina Kirchner não causa surpresa. “O que me surpreende é que isso ocorre durante um ano de eleições, duas semanas depois de Cristina ter anunciado sua candidatura na província de Buenos Aires.”
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