Os escritórios de advocacia Pinheiro Neto e Tortoro, Madureira & Ragazzi informaram nesta segunda-feira (18) que demitiram estagiários apontados por estudantes como alguns dos autores de ataques racistas e classistas contra alunos cotistas da Universidade de São Paulo (USP), que ocorreram durante jogos universitários no último sábado (16).
Os jovens são Tatiane Joseph Khoury e Matheus Antiquera Leitzke, alunos de direito da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP). O g1 tenta contato com a defesa deles.
Os dois foram identificados em meio a outros três colegas por uma “força-tarefa” de estudantes, a partir de vídeos e fotos feitos durante uma partida de handebol masculino realizada em Americana, no interior do estado.
Enquanto as equipes das duas instituições se enfrentavam, torcedores uniformizados da PUC gritavam frases de cunho pejorativo contra estudantes cotistas da USP. Ao mesmo tempo, faziam sinal de dinheiro com as mãos, se referindo à situação socioeconômica das vítimas (veja vídeo acima).
Segundo uma estudante que presenciou a cena, os ataques foram dirigidos a um grupo de estudantes negros. Dentre as ofensas proferidas, os autores teriam dito frases como “cotista filho da p***” e “manda o Pix da esmola”.
Sobre o desligamento de Tatiane, o escritório Pinheiro Neto disse que “não tolera e repudia racismo ou qualquer outro tipo de preconceito”. Questionada se a jovem teria se defendido das acusações, a empresa informou que vai se posicionar apenas por meio da nota divulgada.
O escritório Tortoro, Madureira & Ragazzi afirmou que, inicialmente, determinou a suspensão de Matheus, dando cinco dias para o jovem se manifestar a respeito das acusações. Contudo, o rapaz compareceu à empresa nesta manhã e conversou com o coordenador responsável, na presença da equipe de Recursos Humanos. Ele teria admitido a participação nos atos discriminatórios e aberto mão do prazo de defesa, sendo demitido.
Dentre os outros alunos identificados nas imagens estariam também uma estagiária do escritório Machado Meyer e outro do Castro Barros Advogados.
Procurado, o Machado Meyer informou que “fará as apurações necessárias e avaliará as medidas a serem tomadas”. Disse ainda que tem a diversidade como um de seus pilares essenciais e se empenha em garantir um ambiente profissional pautado pela ética e pelo respeito às diferenças.
Já o Castro Barros se manifestou pelo LinkedIn, informando que o estagiário envolvido no caso não integra mais a empresa. Disse ainda que não admite atos discriminatórios praticado por nenhum de seus integrantes, dentro ou fora do escritório. “Qualquer pessoa que ignore ou despreze esse fato não tem condições de fazer parte do Castro Barros Advogados.”
Uma caloura que também aparece nas imagens foi afastada do Centro Acadêmico 22 de Agosto, da Faculdade de Direito da PUC. Ela fazia parte da Comissão de Permanência do grupo e, segundo o CA, “não havia apresentado posturas problemáticas” até então.
“Considerando nossa política rigorosa de combate a qualquer comportamento discriminatório, removemos a pessoa dos quadros da gestão com rapidez, até que tudo seja devidamente apurado pelas instâncias da Universidade. Logo, a referida aluna não faz parte do Centro Acadêmico 22 de Agosto”, informou o CA.
O g1 apurou que, ao tomarem conhecimento do caso, as parlamentares Luana Alves (vereadora na capital), Letícia Chagas (codeputada estadual) e Sâmia Bomfim (deputada federal), todas do PSOL, fizeram uma denúncia ao Ministério Público de São Paulo pedindo a abertura de um inquérito para apurar os atos racistas praticados.
O caso está sob análise da Promotoria Criminal de Americana.
Em nota conjunta, as diretorias das faculdades de direito envolvidas e os centros acadêmicos de ambas as instituições repudiaram o que chamaram de “lamentáveis episódios” e se comprometeram a investigar o caso, visando responsabilizar os envolvidos.
“Essas manifestações são absolutamente inadmissíveis e vão de encontro aos valores democráticos e humanistas, historicamente defendidos por nossas instituições. Diante disso, as entidades signatárias comprometem-se a apurar rigorosamente o caso, garantindo a ampla defesa e o devido processo legal, e a responsabilizar os envolvidos de maneira justa e exemplar”, diz a nota.
A reitoria da PUC também repudiou o episódio e disse que os fatos serão apurados “com o rigor necessário, a partir das normas universitárias e legais, promovendo a responsabilização e conscientização dos envolvidos”.
Nota conjunta das faculdades de direito
“As Diretorias das Faculdades de Direito da USP e da PUC-SP e os Centros Acadêmicos XI de Agosto e 22 de Agosto das duas instituições vêm a público manifestar repúdio aos lamentáveis episódios ocorridos nos Jogos Jurídicos de 2024. Durante o evento, um grupo de alunos da Faculdade de Direito da PUC-SP proferiu manifestações preconceituosas contra estudantes da Faculdade de Direito da USP, utilizando o termo “cotistas” de forma pejorativa.
Essas manifestações são absolutamente inadmissíveis e vão de encontro aos valores democráticos e humanistas, historicamente defendidos por nossas instituições. Diante disso, as entidades signatárias comprometem-se a apurar rigorosamente o caso, garantindo a ampla defesa e o devido processo legal, e a responsabilizar os envolvidos de maneira justa e exemplar.
Reconhecemos que a segregação social ainda é um desafio no Brasil, mas entendemos que o ambiente universitário deve atuar como um espaço de reparação e transformação. Incidentes como este reforçam a urgência de combatermos todas as formas de hostilidade no meio acadêmico.
Festas e jogos universitários devem ser momentos de integração, congraçamento e solidariedade, não de ódio, violência e intolerância, como não raramente se vê. A luta pela superação de uma cultura de violência nesses espaços depende do engajamento de todos e todas.
Além da responsabilização dos envolvidos, é indispensável avançarmos na direção de políticas preventivas e de acolhimento. Planejamos implementar protocolos que fortaleçam ouvidorias, promovam a prevenção e a educação antirracista e assegurem um ambiente inclusivo e respeitoso para todos os alunos e alunas. Essa é uma demanda frequente da comunidade acadêmica, que exige ações concretas e eficazes.
Estamos determinados a transformar este episódio em um marco para o fortalecimento de uma cultura de respeito, equidade e inclusão em nossas instituições.
FACULDADE DE DIREITO DA USP, FACULDADE DE DIREITO DA PUC-SP, CENTRO ACADÊMICO XI DE AGOSTO e CENTRO ACADÊMICO 22 DE AGOSTO”
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